segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Ao invés de aprovar semianalfabetos, sigamos o exemplo da Coréia do Sul

O Brasil tenta de várias maneiras melhorar a qualidade da educação oferecida nas escolas públicas, desde o Ensino Fundamental até a universidade. Cria índices, provas para avaliação em diferentes níveis e estabelece que os professores devem passar por aperfeiçoamento. Tudo, no fim, em nome do combate à repetência e à evasão escolar.

Apesar de todas essas medidas, uma recomendação do Conselho Nacional de Educação (CNE), aprovada pelo ministro Fernando Haddad nos últimos dias do governo Lula, quer acabar com a reprovação nos três primeiros anos do Ensino Fundamental.

Mas será que a mais recente medida não é apenas um meio de encobrir o que deveria ser feito de outra forma? Não deveríamos estar nos focando em melhorar a qualidade ou em manter os jovens por mais tempo na escola? Ao invés de aprovar todos os alunos, independentemente do que tenham aprendido, deveríamos tomar como exemplo países que até poucas décadas atrás apresentavam péssimos índices educacionais.

A Coreia do Sul seria um bom exemplo de como um país cresce tendo como alavancador a educação. Há 60 anos, a nação asiática estava destruída por uma guerra civil que a dividiu ao meio, deixou um milhão de mortos e a maior parte da população na miséria. Como resultado, um em cada três sul-coreanos era analfabeto. Hoje, oito em cada dez chegam à universidade. Isso não foi feito dando ao aluno a oportunidade de avançar no ensino sem nem ao menos saber ler. Ao contrário, em oito horas de escola diariamente, o segredo está em fazer com que o aluno não passe um dia sem entender a lição.

Lá não houve uma "recomendação" para a não reprovação de alunos, mas uma lei que tornou o Ensino Básico prioridade. Os recursos foram concentrados nos primeiros oito anos de estudo, tornados obrigatórios e gratuitos, como são até hoje. Além disso, bons alunos têm bolsas de estudo e o governo incentiva pesquisas estratégicas. Disso saiu mais um resultado: a Coreia do Sul cresceu 9% ao ano por mais de três décadas.

Outra questão importante é o salário dos professores brasileiros. O piso nacional do magistério, em vigor desde 2008, paga por 40 horas semanais R$ 1.187,00. No caso do Rio Grande do Sul, onde o programa adotado é o de 20 horas, o piso é proporcional, de R$ 593,98. Apesar disso, o básico na categoria no Estado é de R$ 356,00. Lá na Coreia do Sul, um professor ganha o equivalente a R$ 10.500,00 mensais.

Em 2008, a Organização Internacional do Trabalho e a Unesco publicaram um ranking mundial de salários de professores em 38 países. O Brasil (média de R$ 11 mil por ano) aparecia no antepenúltimo lugar, perdendo apenas para Peru (média de R$ 9.500,00 por ano) e Indonésia (média de R$ 3.200,00 por ano). Nossos vizinhos Uruguai e Argentina pagavam uma média de R$ 20 mil por ano.

Neste ano, um estudo da PricewaterhouseCoopers mostrou que, em 2050, o Brasil será a quarta economia do mundo. A previsão é de que, ainda em 2011, o Brasil supere pela primeira vez a França e, em 2013, ultrapasse o Reino Unido, atingindo a sétima posição incentivada pelo mercado doméstico e pela exportação de recursos naturais. E onde fica a educação nisso? O Brasil tem avançado muito em diversos setores, mas deixar todo mundo passar e não assumir a responsabilidade por uma educação de melhor qualidade, com professores melhor remunerados... isso é o Brasil de hoje.

http://jcrs.uol.com.br/site/noticia.php?codn=55786 – sítio acessado em 28/02/2011 às 08:55h.
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quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Sobre o aumento das tarifas dos transportes coletivos de Porto Alegre

“Ninguém gosta de aumento, mas todo mundo gosta de ônibus novos.” Esta frase foi proferida por Jaires da Silva Maciel, presidente do Comtu (Conselho Municipal de Transportes Urbanos) e veiculada no Jornal do Comércio, no dia 09/02/2011, no artigo intitulado “Tarifa de ônibus sobe 10,2% e fica acima da média da inflação”. Minha indignação perante mais esta imposição ao povo foi tamanha que somente agora, com mais calma, consigo ordenar as diversas questões que me afligiram. Enquanto se debatia ferozmente o reajuste do salário-minímo (que continua abaixo do mínimo necessário, ressalto), foi concedido um aumento de 10,2% na tarifa porto-alegrense de ônibus, 60% acima da inflação registrada no ano de 2010. E sua vigência foi imediata, ao contrário do paliativo oferecido para amenizar a contundência do aumento, de isentar a segunda passagem dos usuários do cartão TRI, desde que não exceda o prazo de meia hora entre uma e outra viagem, que vigorará a partir de 01/07/2011. O presidente Maciel, naquele mesmo artigo, atribuiu tal percentual ao incremento de 242 veículos novos na frota de coletivos. Muito bom. Só quero saber onde estão estes veículos novos, pois vi nenhum na linha que utilizo (Santo Agostinho). Assim como também quero saber como estão distribuídos os veículos climatizados, uma vez que nem de perto 40% desta linha que utilizo possui ar-condicionado (o percentual foi informado pelo presidente Maciel). A situação se agrava nos horários de pico, quando os passageiros são transportados como sardinhas, em uma superlotação desumana, e como sacos de batata, jogados que são de um lado para o outro dentro do veículo, sem conforto algum. Aproveito para ressaltar a péssima qualidade do serviço prestado pelos funcionários das empresas de transporte coletivo. Muitos motoristas (o adjetivo evita a generalização) aceleram e freiam exageradamente, desconsiderando que transportam pessoas, e não coisas. Fiscais que “tocam a boiada” para dentro do ônibus, como ouvi um dizer na parada, quando retornava da aula para casa. O foco do serviço já não mais é o consumidor, e sim rodar mais a roleta com menos carros à disposição.

Sempre defendi a utilização do transporte coletivo como opção ao trânsito caótico que se instala em Porto Alegre, mesmo ciente do quanto deixa a desejar. Inclusive desconsiderei até agora a hipótese de ter um automóvel particular. Mas, frente a mais esta demonstração de desrespeito ao contribuinte, começo a rever minha posição. Manifestos foram feitos contra esta imposição e deram com os burros n’água. Infelizmente. Assim como tenho consciência que este meu desabafo não terá maiores repercussões junto aos nossos “representantes” no poder. A situação fica mais periclitante ainda quando a instância que deveria considerar a opinião da população, ou seja, o Estado, não é mais garantia de apoio. Está na hora de começarmos de fato a mudar este quadro, seja através de manifestações concretas e contundentes, como as que presenciamos no mundo árabe, seja através da educação cidadã, para que entendamos que qualquer atividade que exerçamos, qualquer serviço ou bem que disponibilizemos, não são um fim em si mesmo. O fim está nas pessoas que compartilham o espaço diariamente.
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quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Revolução cultural no Brasil: um devaneio para Dilma

Paulo Costa Lima
De Salvador (BA)

A grande revolução brasileira: se tornar uma nação para todos os filhos. Esse ideal aparece ao longo dos séculos em situações diversas, conhece avanços e retrocessos, mas continua sendo um ideal. Concretizá-lo é o nosso destino.
Não poderia ser muito diferente com relação à cultura. Impossível pensar em grandes transformações sem uma noção ampliada do fenômeno, capaz de absorver conceitos e práticas que se espalham pelo nosso território, definindo-o.
Cultura como direito de todos os cidadãos. O papel das mídias nesse artesanato de democracia. As concessões e os conteúdos. A capacidade crítica. Os direitos autorais e coletivos. A memória. O diálogo com o mundo. As cadeias produtivas das artes...
Ora, tudo isso tem sido objeto de discussão e tem aparecido como propostas governamentais, projetos de lei, programas inovadores, deixando um saldo positivo de transformações sobre o qual deverá atuar a ministra Ana de Hollanda.
Há, todavia, uma fronteira indispensável que tem recebido muito menos atenção do que deveria. Um simples devaneio ilustra o caso: o que aconteceria com a vida cultural brasileira se de repente surgissem 220.000 corais mobilizando 6.600.000 vozes?
Parece coisa de doido? Nem tanto. Bastaria que cada escola brasileira criasse um coral em 2011. Villa-Lobos já sonhou com isso. Pois é, são 220.000 escolas envolvidas com formação básica e cerca de 60 milhões de estudantes ávidos por identidade e pertencimento.
Agora imagine o impacto cultural causado pela criação, em cada escola, de também um grupo de dança, outro de capoeira, um grupo de teatro, um clube de leituras, um festival de poesia e um clube de cinema... Nada do outro mundo, com incentivo e direcionalidade as comunidades escolares podem fazer isso.
Já pensou a qualidade que seria filtrada por essa pirâmide gigantesca de conhecimento? E o impacto dessas atividades sobre a formação de mercados, especialmente o nível de qualidade, a produção de conteúdos, as visões de mundo...
Acho que basta esse devaneio preliminar para mostrar que o caminho de uma verdadeira revolução cultural no Brasil passa necessariamente pela Escola... e que não é da ordem do impossível.
Agora, precisa entender a escola como uma grande sinapse entre a vida familiar e comunitária, o tesouro cultural da humanidade e os estímulos da mídia... Pensá-la como lugar de vivências e de experimentação cultural, sabendo que o projeto pedagógico não existe sem a consciência de sua dimensão cultural.
Há avaliações internacionais do nosso sistema educacional que criticam o capital cultural que mobiliza. Houve em nosso País, desde a ditadura, e há no mundo atual de forma generalizada, um definhamento da capacidade da escola de dialogar com o imaginário, e de mobilizar o sujeito desejante.
Como sabemos, quem vem pautando o imaginário da população é a novela das oito e congêneres. A revolução cultural necessária passa pela diversificação do controle da mídia e pela potencialização dessa rede de 220.000 pontos de cultura chamada Educação.
Há documentos norteadores importantes produzidos pelo próprio governo em torno da discussão sobre currículo e cultura - Cf. Moreira e Candau no portal do MEC. Mas o pensamento sobre multicuturalidade parece não atingir a etapa necessária do empoderamento do aluno como criador, a ênfase recai na fruição crítica.
Obviamente, essa ciranda de mobilização cultural das escolas não se restringe às artes. Trata-se da abertura para discutir o Brasil, discutir o mundo, falar de história, filosofia, internet, ancestralidades, direitos humanos... De forma proativa. Criando papéis e gozos.
Os anos vão passando e 'educação e cultura' não conseguem produzir resultados convincentes de integração e sinergia. Como estabelecer um diálogo estruturante entre essas duas esferas em todos os níveis - federal, estadual e municipal? Obviamente não existe. Na frieza dos organogramas não há estruturas de governo com a finalidade precípua de promover tal integração.
Trata-se, portanto, de algo que precisa ser firmado como prioridade de governo. Independente da boa vontade dos ministros envolvidos, que parece certa - já houve um movimento interessante nessa direção entre 2009 e 2010-, é preciso perceber o valor estratégico dessa questão, declarando-a prioridade nacional.
Educação como sistema imunológico da coletividade, sendo a Cultura a garantia de que há investimento sério na direção da formação de jovens cidadãos com capacidade crítica e criadora.
Fica o devaneio: que o futuro da sociedade brasileira seja discutido em milhões de pequenas rodas, e que os jovens redescubram a ousadia da cultura como estratégia cognitiva, especialmente no redesenho daquilo que chamamos currículo, digo, vida.